domingo, dezembro 18, 2005

A OITAVA MARAVILHA DO MUNDO

Em 28 de dezembro de 1895, os irmãos Auguste e Louis Lumière apresentaram para o público a mais nova invenção de sua empresa: um aparelho que captava e exibia imagens em movimento, pomposamente batizado de Cinematógrafo. O evento entrou para a História como a primeira sessão de cinema. Ao que consta, o genitor dos Lumière não botava muita fé naquela então novidade, prevendo que rapidamente seria esquecida. Felizmente, para quem ama o cinema, o tempo mostrou que de profeta “papai Lumière” não tinha nada.

Não tardaria para que um outro francês, o genial Georges Méliès, transcendesse as curtíssimas tomadas de situações cotidianas, como eram os primeiros filmes, e apresentasse Viagem à Lua, produção definidora daquela que talvez seja a maior vocação do cinema: arrebatar o público para universos imaginários que somente esta forma de entretenimento pode tornar virtualmente possíveis. É da “linhagem” de Méliès que descende o neozelandês Peter Jackson. O cineasta já havia dado provas disto ao transpor para as telas com maestria a Terra Média, suas histórias e habitantes, na trilogia O Senhor dos Anéis. Agora, Jackson surpreende novamente ao recriar a Nova York da Grande Depressão e uma das criaturas mais clássicas do cinema: King Kong.

A história do King Kong de Peter Jackson nada tem a ver com a versão politicamente correta dos anos 70 (que adoro, por sinal), seguindo basicamente a trama do original de 1933. O diretor/produtor/roteirista dividiu os 187 minutos da película em três atos. No primeiro, de ritmo mais lento, somos apresentados à atriz Ann Darrow (Naomi Watts), ao cineasta Carl Denham (Jack Black), ao roteirista Jack Driscoll (Adrien Brody) e aos demais passageiros e tripulantes do navio Venture, que parte rumo a uma enigmática locação. O segundo ato é marcado por uma vertiginosa aventura na Ilha de Itu, quer dizer, da Caveira, onde os personagens precisam enfrentar nativos agressivos, dinossauros anacrônicos e até insetos gigantes a fim de resgatar Ann das patas do gorila colossal Torê Kong. No derradeiro (e aguardadíssimo) ato, o filme volta para a ilha de Manhattan, na qual o macacão, apresentado como “a oitava maravilha do mundo”, encontra o seu trágico destino no alto do Empire State Building.

Além de lugares existentes no passado ou na imaginação, a narrativa de Jackson passeia por diferentes gêneros. Apesar do contexto pós-Crise de 1929, as situações do início do filme são típicas de uma comédia. A proximidade da Ilha da Caveira leva ao suspense. Uma vez neste ambiente, começa a ação. Aqui, se o público não chega a fugir da sala de cinema com medo de que alguma coisa saia da tela em sua direção (como supostamente ocorreu na histórica sessão dos Lumière), dificilmente se contém diante da visualização de um dos maiores temores da humanidade: o ataque de asquerosos insetos “tamanho GG”. E tudo termina em um drama de arrancar lágrimas.

Sim, dá vontade de chorar ao final deste King Kong. E as razões são muitas. A começar pelo carisma de Kong. Até aqui, este é o grande (em todos os sentidos) personagem digital da história do cinema. Não estou falando só da técnica, mas sobretudo dos traços de humanidade que o personagem apresenta. O Kong de Jackson acima de tudo é um ser melancólico. Sua existência é solitária e sem sentido. Mesmo com o brilho que Ann passa a dar em sua vida, parece que o gigantesco símio compreende que a morte é sua única perspectiva. Preciso confessar que, como uma criança, desejei até o último momento que Jackson alterasse o final original e que Kong milagrosamente se salvasse.

A tristeza do acender das luzes também se explica porque no horizonte dos próximos lançamentos cinematográficos, não vejo um outro filme que provoque em mim a mesma empolgação das produções cinematográficas que marcaram a minha infância, como este King Kong provocou. O nó na garganta e o aperto no coração que senti após o desfecho do filme soaram como as mesmas sensações, então misteriosas, despertadas há vinte e poucos anos quando assisti à minha primeira sessão (consciente) de cinema, o maravilhoso E.T., de outro brilhante “discípulo” de Méliès: Steven Spielberg.

O cinema não poderia ter comemorado seus 110 anos em melhor estilo.


4 Comments:

  • Tenho que assistir essa semana!!! Esse filme realmente deve ser o acontecimento cinematográfico do ano! Ah! Sua resenha está ótima! Parabéns!

    By Anonymous Anônimo, at 12:40 PM  

  • Uma grande obra, sem dúvida. Quase tudo no filme é perfeito, e as falhas são "tapadas" pela perfeição de direção, atuação e efeitos, que de vez em quando exageram, mas nada que prejudique. Não poderia ser melhor!!!!

    Um abraço, e até!

    By Blogger Luiz Henrique Oliveira, at 5:12 PM  

  • Oi, Paulo! Também quero ver o velho Kong... mas não sei quando... as férias chegaram e parece q vou continuar enrolada... o assunto do momento é: tchan tchan tchan tchan: meu novo blog, no Blogger, já existe. Queria mostrá-lo "ao mundo", com tudo pronto, sem pedir ajuda, mas vai ser impossível... precisarei do personal teacher pra botar as frase no rodapé, etc, etc... então vou ter q te perturbar em breve. Pena já estarmos tão próximos ao Natal, sei q vai ficar complicado. Mas eu entro em contato. Beijos.

    By Anonymous Anônimo, at 11:57 PM  

  • Brilhante comentário, Paulo.
    A WETA Ltd. conseguiu finalmente criar OLHOS que passem emoções, e não aqueles olhos vazios de outras criaturas digitais. Nesse aspecto, Jackson obteve sucesso. Não gostei do filme tanto quanto você, mas pela escala e pela inovação, é um belo presente de aniversário para o Cinema mesmo.
    Cumps.

    By Blogger Gustavo H.R., at 11:49 AM  

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